
O trabalho dos pesquisadores do Departamento de Medicina
Preventiva da Universidade de São Paulo (USP) usou dados da literatura
científica produzida em 54 países para calcular a média de horas diárias em que
as pessoas passam sentadas e o quanto isso contribui para aumentar a
mortalidade. De acordo com o líder do estudo e autor correspondente do artigo,
Leandro Rezende, desde 2010, pesquisas indicam a relação entre esse hábito e o
número aumentado de óbitos, mas, além de apresentar cálculos para uma quantidade
expressiva de países, o grupo da USP quis verificar se a prática de exercício
físico poderia reduzir os riscos associados.
A meta-análise mostra que, ajustando todos os fatores que
influenciam na mortalidade, ficar sentado por mais de três horas é um hábito
associado ao risco aumentado de óbito em todos os lugares analisados, que,
juntos, representam 25% da população adulta mundial. Em média, os habitantes
desses países passam 4,7 horas/dia nessa posição, variando de 4,2 horas (países
americanos) a 6,2 horas (países do Pacífico Ocidental). No geral, ficar mais de
três horas por dia sentado foi responsável por 433 mil mortes, ou 3,8% de todos
os óbitos registrados nas 54 nações analisadas, com percentuais variando de 2%
no sudeste asiático para 5,7% no Pacífico Ocidental. Rezende esclarece que não
havia literatura científica sobre o Brasil contendo esses dados, mas que a
realidade do país se insere no que foi observado em relação às Américas em
geral.
Ao mesmo tempo, remover alguns minutos do tempo em que se
passa sentado foi capaz de reduzir a mortalidade. “Mesmo reduções modestas,
como 10% do tempo médio, ou 30 minutos por dia, teriam impacto na mortalidade
por todas as causas nos 54 países avaliados. Mudanças mais robustas, como 50%
de redução, ou duas horas, representariam ao menos três vezes menos mortes,
comparando com o primeiro cenário”, diz o pesquisador da USP.
Mudanças contextuais
Porém, ao contrário do que já se sugeriu, a prática regular
de exercícios físicos não foi capaz de diminuir o risco de morte no caso de
pessoas que passavam mais de três horas sentadas. Por isso, Rezende destaca que
é preciso investir em mudanças contextuais, não apenas no ambiente de trabalho,
mas também nas cidades, para permitir que a população passe mais tempo se movimentando.
“Não depende da força de vontade e da motivação individual de fazer exercício.
O tempo que passamos trabalhando sentados é altamente determinante, assim como
a forma que as cidades estão planejadas. Precisamos de calçadas bem cuidadas,
de ciclovias, de um ambiente social mais favorável à prática de atividades em
vários momentos, seja na forma de transporte e deslocamento, seja nas
atividades do dia a dia”, defende.
O pesquisador da USP esclarece que a linha de investigação
que associa o tempo em que se passa sentado e o risco de morte é recente e que,
portanto, é preciso cautela na interpretação dos resultados. “Não sabemos ainda
se há uma relação causal, como é a do tabagismo com o câncer de pulmão, por
exemplo. Há indícios dessa causalidade, mas isso precisa ser confirmado”, diz.
O cardiologista Fausto Stauf-fer, coordenador de Cardiologia
do Hospital Santa Lúcia Norte e diretor científico da Sociedade Brasileira de
Cardiologia (SBC), explica que estudos anteriores mostram que ficar sentado por
muito tempo afeta negativamente as taxas de glicose e colesterol, além do
índice de massa corporal (IMC) e da circunferência da cintura, mesmo em
indivíduos que praticam exercícios físicos. A alteração desses parâmetros
fisiológicos poderia explicar o aumento da mortalidade, ao menos nos casos de
óbitos por doenças cardiovasculares.
“A gente ainda não sabe o porquê disso. Em
termos de orientação, o que podemos é dizer para as pessoas controlarem melhor
os outros fatores de risco e tentarem ficar mais em pé.”
Fonte:
http://www.correiobraziliense.com.br/app/noticia/ciencia-e-saude/2017/06/04/interna_ciencia_saude,600042/ficar-sentado-mais-de-3-horas-por-dia-e-associado-a-433-mil-mortes-por.shtml