Estudo
publicado em 2016 por pesquisadores brasileiros revelou que neurônios que
habitam o intestino são os responsáveis por ativar células de defesa em caso de
“perigo”. O perigo pode ser causado por bactérias que entram no organismo
acompanhadas por algum alimento.
Em seu
doutorado na USP, Ilana Gabanyi – atualmente pós-doutorando do Instituto
Pasteur em Paris – descobriu junto de Frederico Costa-Pinto, professor da
Faculdade de Medicina Veterinária da USP, que neurônios mais próximos do
interior do tubo digestivo “alertam” os macrófagos sobre a presença de algum
micro-organismo causador de doença. Para explicar essa comunicação, os
cientistas contam como funciona a digestão e sua interação com o sistema imune.
Macrófagos
Estas
células do sistema imunológico, conhecidas como macrófagos, desempenham
diferentes papéis de monitoramento e reparação em todo o corpo. Costa-Pinto, um
dos autores do estudo, lembra que uma das funções mais primitivas de defesa do
organismo é englobar – ou, em linguagem científica, fagocitar – um eventual agente
infeccioso. “Há uma relação muito antiga entre células de defesa e sistema
nervoso”, diz. Com essa informação em mente, o veterinário de formação procurou
entender melhor o papel do macrófago em uma das mais prestigiadas universidades
na área biomédica, a Rockefeller. Lá, convidado pelo colega, também brasileiro,
Daniel Mucida, ele e sua então aluna de doutorado, Ilana Gabanyi gastaram horas
nos modernos microscópios que permitiam
visualizar a movimentação das células em camundongos vivos.
A observação
rendeu duas descrições diferentes da função dos macrófagos no chamado sistema
nervoso entérico – as redes de neurônios que integram o sistema digestivo. Os
macrófagos da camada mais próxima do lúmen, onde estão as bactérias, atuavam
promovendo inflamação. Um padrão já esperado. Já os macrófagos que compõem a
camada chamada de muscularis, região mais distante do lúmen, expressavam genes
anti-inflamatórios quando estimulados pelos neurônios do sistema nervoso
simpático.
“A mensagem
que esses neurônios passam faz com que os macrófagos se tornem mais ativos na
proteção do tecido intestinal”, ressalta Ilana.
A “mensagem”
é, na verdade, um neurotransmissor conhecido como noradrenalina, que os
neurônios liberam quando detectam bactérias potencialmente patogênicas. Nos
experimentos, os pesquisadores utilizaram um tipo de salmonella atenuada, que
não chegava a causar lesões no intestino. Apesar de menos agressiva, a presença
da bactéria foi suficiente para ativar a proteção.
Intestino:
lugar de neurônio?
O intestino
agrega a maior coleção de neurônios fora do cérebro. São eles os responsáveis
pelas funções autônomas do sistema digestivo. Porém, não é qualquer neurônio
que participa da conversação com os macrófagos. O artigo identificou que os
responsáveis por essa comunicação são grupos de neurônios do sistema nervoso
simpático (SNS). O SNS é famoso por desencadear respostas a situações de
estresse, como a reação de ficar ou fugir.
Mas a
despeito de suas origens, é no intestino que esses neurônios habitam,
convivendo com outras células abundantes por lá: as células do sistema imune.
Para Costa-Pinto, a interação neuroimune encontrada no órgão é uma espécie de
sistema sensorial de alterações que causem prejuízos ao intestino.
O artigo
“Neuro-immune Interactions Drive Tissue Programming in Intestinal Macrophages”
foi publicado na revista científica Cell.
Fonte: http://ciencia.usp.br/index.php/2018/02/06/o-segundo-cerebro/